sexta-feira, 8 de junho de 2018

ANÁLISE DO PERFIL DE SÓCRATES EM TRÊS OBRAS: A DEFESA DE SÓCRATES – PLATÃO. A APOLOGIA DE SÓCRATES – XENOFONTES AS NUVENS – ARISTÓFANES


ANÁLISE DO PERFIL DE SÓCRATES EM TRÊS OBRAS:
A DEFESA DE SÓCRATES – PLATÃO.
A APOLOGIA DE SÓCRATES – XENOFONTES
AS NUVENS – ARISTÓFANES
INTRODUÇÃO

Poucas vezes na história apareceram homens com tamanha determinação, virtude e caráter como Sócrates. De fato, até hoje, é dele um dos grandes discursos registrados, que infelizmente, foi o de sua defesa no tribunal contra as acusações que lhe faziam. Quais pessoas que passaram pela vida, e, nela foram totalmente autênticos com seus ideais, e que também foram desapegados a tudo que os demais desejavam, sem serem perseguidas? Com Sócrates não foi diferente. Analisar-se-á neste breve trabalho um pouco sobre esse misterioso perfil em base das três obras assim citadas por Pessanha:
 “Sócrates não deixou nenhum escrito. Tudo o que sabemos sobre ele — sobre sua vida e sobre seu pensamento — provém de depoimentos de discípulos ou de adversários. Os historiadores da filosofia são unânimes em considerar que os principais testemunhos sobre Sócrates são fornecidos por Platão e Xenofonte, que o exaltam, e por Aristófanes, que o combate e satiriza. Do confronto desses diferentes retratos é que se pode tentar extrair a verdadeira fisionomia de Sócrates.”(Pessanha, 1987 pg32).

1. O HOMEM SÓCRATES DA DEFESA

Neste texto, Platão é quem narra a defesa de Sócrates, e como discípulo, tem um discurso apaixonado pelo mestre. Como explica Santiago

“A primeira questão evidente na obra é se as palavras que Platão "coloca" na boca de Sócrates seriam as mesmas proferidas em concreto perante o Tribunal de Atenas ou na verdade refletem o pensamento de Platão em relação às injustiças sofridas por Sócrates.” (SANTIAGO, 2017)
                          
            Porém, ainda sim, Borges afirma que mesmo com a admiração de Platão, o discurso de Sócrates não deixa de ter autenticidade, mostrando sim sua personalidade (BORGES, 2017)
            Sócrates diz não ser igual àqueles que o acusam, que falam com exuberância, porém nunca dizem a verdade. Ele, porém, é espontâneo, e não sabe ser nada além dele mesmo. (Platão, 1987 pg33)
            Seu orgulho sobre os demais homens é simples, se considera mais sábio de Atenas porque reconhece que nada sabe, dizia ele “só sei que nada sei!”. Diferente dos outros homens que nada sabem, porém, pensam que sabem. (Platão, 1987 pg38)
            Homem de convicção, mesmo com o risco da condenação não muda de opinião, ainda cita Aquiles, que mesmo alertado que morreria se enfrentasse Heitor, não teme em reconstituir a honra. (Platão, 1987 pg45)
            A morte para Sócrates aqui, é um mistério que pode levá-lo talvez ao maior bem do homem. Ele não a teme. Acredita que mesmo que seja o fim, seria como uma boa noite de sono, e caso seja um encontro com os mortos, seria uma honra conhecer todos os heróis gregos.
            Tem convicção que mesmo se for absolvido, continuará a filosofar, e nunca deixará de fazê-lo. Diz também que nunca cobrou para ensinar, e não consegue fazê-lo como faz Górgias, diz ele: “(...) estou igualmente à disposição do rico e do pobre, para que me interroguem ou, se preferirem ser interrogados, para que ouçam o que digo.” (Platão, 1987 pg50).
            Sócrates é autêntico. E continua sendo até quando tem capacidade de argumentar para livrar-se da morte, não o faz para não trair a si mesmo. Como ele diz para aqueles que o condenaram:
“(...)talvez imagineis, senhores, que me perdi por falta de discursos com que vos poderia convencer, se na minha opinião se devesse tudo fazer e dizer para escapar à justiça. Engano! Perdi-me por falta, não de discursos, mas de atrevimento e descaro, por me recusar a proferir o que mais gostais de ouvir, lamentos e gemidos, fazendo e dizendo uma multidão de coisas que declaro indignas de mim, tais como costumais ouvir dos outros”  (Platão, 1987 pg55)

            A defesa termina com a frase de Sócrates: “Bem, é chegada a hora de partirmos, eu para a morte, vós para a vida. Quem segue melhor rumo, se eu, se vós, é segredo para todos, menos para a divindade.” (Platão, 1987 pg58).


2. A APOLOGIA DE SÓCRATES – XENOFONTES

O escrito de Xenofontes não carrega a tamanha admiração de Platão por seu mestre. No livro Os pensadores se encontrará:

“Xenofonte traça o perfil do mestre e transcreve o que colhera de seus ensinamentos. Se o Sócrates visto por Xenofonte não possui a mesma profundidade filosófica daquele que é mostrado por Platão, sua grandeza humana é igual e igualmente enaltecida” (Pessanha, 1987 pg27).

A filosofia de Sócrates a respeito da morte para Xenofontes é diferente. Apesar de Sócrates estar muito seguro a respeito de sua condenação, seu entendimento parece mudar. Na apologia, o condenado fica agradecido por ter chego sua hora, acredita até, ser a vontade de deus. Como afirma Xenofontes:

“Sócrates diz ter articulado sua defesa por duas vezes. Para persuadir os juízes, mas não conseguiu, seu demônio interno não permitiu. Também pensa ser a vontade de deus sua morte, e acha bom. Pois não quer viver doente ou morrer de velhice: preferirei morrer a mendigar servilmente a vida e fazer-me outorgar uma existência mil vezes pior que a morte” (Xenofontes, 1987 pg179).

Não são necessários muitos comentários sobre o homem Sócrates para Xenofontes, já que sua opinião é próxima de Platão, basta aqui, encerrar com seu comentário final:

“Recuara diante dos outros bens, assim não fraquejou à barba da morte e serenamente a recebeu e sofreu. Quando reflito na sabedoria e grandeza de alma deste homem, não posso deixar de acordar-lhe a memória e a esta lembrança juntar meus elogios. E se dentre os enamorados da virtude alguém houver que haja privado com homem mais prestante que Sócrates, reputo-o o mais venturoso dos mortais.” (Xenofontes, 1987 Pg.184)

AS NUVENS – ARISTÓFANES

            A visão de Aristófanes é diferente das anteriores. Serve de um contraponto para a personalidade de Sócrates. Dirá Pessanha:
“E, possivelmente, um dos motivos da divergência entre os depoimentos que oferecem e o de Aristófanes reside neste fato: eles falavam do Sócrates maduro, o mestre que se considerava imbuído da missão — assumida em face de decisiva declaração do oráculo de Delfos — de despertar os homens para o conhecimento de si mesmos. Já Aristófanes, particularmente n’As Nuvens, teria feito uma caricatura do Sócrates mais jovem, personagem já famosa em Atenas antes mesmo de desempenhar a atividade missionária de que se julgou incumbido mais tarde.” (Pessanha, 1987 Pg17)

Sócrates para Aristófanes é um enganador, charlatão, louco, considerado como sofista. Em um trecho por exemplo, Estrepsíades protagonista da história aponta para casa de Sócrates e diz:

“ESTREPSÍADES (Declamando.) De almas sábias é aquilo um "pensatório". . . Lá moram homens que, (...) Se a gente lhes der algum dinheiro, eles ensinam a vencer com discursos nas causas justas e injustas.
FIDÍPIDES Ah! Já sei, uns coitados! Você está falando desses charlatães, pálidos e descalços, entre os quais o funesto Sócrates e Querefonte...” (Aristófanes, 1987 Pg190)

            Ao longo da peça acontecem diversas situações em que mostram não apenas Sócrates, mais também todos os seus discípulos divagando sobre diversos assuntos. Comprovando eles, coisas com as maiores bobagens possíveis, como medir o salto de uma pulga com as “botinhas de cera” colocadas nela. Aristófanes também deixa muito explícito que considera Sócrates um ateu. Pode-se ver isso neste trecho:

“SÓCRATES Pois de fato só elas é que são deusas (as nuvens), todo o resto são lorotas!
ESTREPSÍADES (Assustado.) Epa! E Zeus, em nome da Terra! Para vocês o Olímpio não é um deus?
SÓCRATES Que Zeus? Não diga tolices! Nem sequer existe um Zeus!” (Aristófanes, 1987 Pg202)

            A peça mostra um Sócrates que manipula e orienta os jovens a discursar o que quiserem, fazer da sua vontade a própria verdade. Tamanha capacidade de ensino da sua escola, que Fidípides aprende a dar justificação até para bater no próprio pai. O ultimato da peça sobre Sócrates para aquele que foi “enganado” por ele:

“ESTREPSÍADES - Ai, que falta de juízo ! Como estava louco quando quis jogar fora os deuses por causa de Sócrates! (...) Mas, meu caro Hermes, não fique com raiva de mim, não acabe comigo, tenha compaixão, porque enlouqueci com fanfarronices! (...)(Finge ouvir o que diz a estátua.) Dá-me um bom conselho, não me deixando remendar processos mas dizendo-me a que ponha fogo na casa dos fanfarrões, o mais depressa possível!”  (Aristófanes, 1987 Pg241)

Conclusão

            Observados todos esses contextos, pode-se confundir a personalidade de Sócrates. Realmente não existem certezas para quem seria realmente o homem Sócrates. Também foi visto que a confusão pode ter acontecido por levá-lo em conta antes e depois de sua “tal conversão”.
            Porém, pode-se afirmar um caráter heroico nesse homem, justificando tais perseguições contra seu caráter. Levando em consideração esses pontos:
Se a peça de Aristófanes tocasse verdadeiramente algum aspecto da pessoa de Sócrates, teria ele aceitado pagar uma multa, rememorando assim sua época juvenil perturbada. Porém, sabe-se que ele tinha a verdade ao próprio lado e, graças a ela, não voltou atrás.
 Não poderia alguém com tamanha loucura traçada na peça As nuvens adquirir a fama que parece ter Sócrates, mesmo quando jovem. Também não valeria a pena escrever uma peça para um personagem tão ridículo historicamente. Está a graça da peça, em ridicularizar tudo o que ninguém compreendia. Se acaso fosse Sócrates da forma que mostra o Teatro, onde estariam as surpresas e os fatos cómicos. Todas as críticas parecem sair da ignorância dos ouvintes de Sócrates que não eram capazes de compreender tais ideias. O Primeiro deles o próprio Aristófanes.
Não seria possível existir tal homem da defesa e da apologia, se esse não reconhecesse seu período perturbado de vida. Caso Sócrates tivesse passado por tal condição, de enganador e “canalha”, ele mesmo teria pedido uma punição para si. Pois não suportaria ter que viver com tal fardo.
Ainda considerando esse Sócrates, que tem seu orgulho em sua humildade, também dificilmente falaria que Atenas é quem perderia mais com sua morte, pois não encontrariam outro igual. Como também: “o verdadeiro sábio é aquele que como Sócrates compreendeu que sua sabedoria é verdadeiramente desprovida do mínimo valor.” (Platão, 1987 pg 39) essas duas frases que aparentam vir de Platão, não se encaixam nesse perfil. Sócrates não citaria o próprio nome na frase.
Percebe-se então que os textos de Platão e de Xenofontes possuem mais valor. Um homem que não muda seu discurso perante a morte, em favor da própria vida por convicções, possui grande caráter. E é histórico que morreu. Ninguém morre por uma mentira, e se fosse, Sócrates saberia que mentia, aceitando assim uma punição que lhe caberia.
Sócrates deixou um grande ensinamento. Talvez seja fácil escapar da morte (aqui, a injustiça), difícil é lutar contra a maldade: “(...) ela corre mais ligeira que a morte” (Platão, 1987 pg 56). Para isso, é preciso ir além dos limites, se necessário, dar a própria vida em favor da verdade e do bem.

BIOGRAFIA

(BORGES, 2017) Donaldo de Assis Borges. Advogado e Professor Universitário em Franca/SP. UMA ABORDAGEM TEÓRICA: “APOLOGIA DE SÓCRATES” DE PLATÃO. http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/filosofia/uma-abordagem-teorica-apologia-socrates-platao.htm

(SANTIAGO, 2017) Emerson Santiago Apologia de Sócrates  

http://www.infoescola.com/filosofia/apologia-de-socrates) Acesso 04/04/2017 10h36


(Pessanha, 1987). (Platão, 1987) (Xenofontes, 1987) (Aristófanes, 1987) Platão 428 ou 7-348 ou 7 A.C.  Defesa de Sócrates / Platão. Ditos e feitos memoráveis de Sócrates ; Apologia de Sócrates / Xenofonte. As nuvens / Aristófanes ; seleção de textos de José Américo Motta Pessanha ; traduções de Jaime Bruna, Libero Rangel de Andrade, Gilda Maria Reale Strazynski. — 4. ed. — São Paulo : Nova Cultural, 1987.

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